05.09.09 às 23h53 > Atualizado em 06.09.09 às 02h29
Gays são caçados nas favelas do Rio pelo tráfico e pela milícia
Violência afeta ao menos um homossexual por dia nas comunidades. No País, um morre a cada 2 dias
POR MAHOMED SAIGG, RIO DE JANEIRO
Arte O Dia
PAÍS MAIS HOMOFÓBICO DO MUNDO
Com um homossexual assassinado a cada dois dias, o Brasil passou a ser considerado o País mais homofóbico do mundo, seguido por México, que registrou 35 casos ano passado, e Estados Unidos, com 25.
Presidente do Grupo Conexão G, Gilmar Santos alerta que este número pode ser ainda maior. “A opressão contra os homossexuais nas favelas vem aumentando a cada dia. Nas pesquisas de campo a gente descobre que a maioria dos casos não é registrada. E, mesmo quando as vítimas resolvem procurar a polícia, muitos preferem não revelar sua orientação sexual por temer mais violência”, explica.
Ex-moradora da Zona Sul, a jovem Patrícia, 24 anos, viu de perto os horrores vividos pelos homossexuais nas favelas do Rio. Depois de se assumir como lésbica, ela se mudou para o Morro da Providência, no Centro, onde morou por oito meses com a namorada. “Além de bater nos gays e travestis, os bandidos ficam ameaçando estuprar as lésbicas. Fazem um terror psicológico insuportável”, conta. “Quando descobrem uma lésbica no morro, dizem que a garota só se tornou homossexual porque não conheceu homens de verdade. E que darão ‘um jeito’. É por isso que hoje muitas meninas agem como se fossem mulheres quando estão no morro e só assumem sua orientação quando saem de lá”, completa.
Na Favela do Timbau, na Maré, a homofobia também vem marcando a vida dos homossexuais. Nascido e criado na comunidade, o travesti Marcela Soares, 40 anos, conta que já perdeu muitas amigas torturadas e assassinadas só por serem homo.
“Isso já está se tornando comum nas favelas. E a gente não pode fazer nada senão morre também”, lamenta Marcela, que admite sofrer com o preconceito. “A gente se sente humilhada, afinal também somos humanos como os heterossexuais e exigimos respeito”, desabafa Marcela, que é formada em Moda.
‘Matar homossexual virou diversão’
A violência contra homossexuais nas favelas do Rio vem chamando a atenção de militantes do movimento LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros) e pesquisadores de todo o Brasil. O presidente do Grupo Gay da Bahia, Marcelo Cerqueira, ameaça denunciar o governo brasileiro à Organização das Nações Unidas e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos.
“Bater e matar homossexual já virou entretenimento popular nas favelas. Mas não vamos ficar assistindo a esse ‘homocausto’ (holocausto de homossexuais) de braços cruzados. Já que não temos força política para brigar por nossos direitos, esta é uma maneira de tentar nos proteger dessa violência”, explica Marcelo.
Professor escapa por pouco de incêndio criminoso
A violência contra os homossexuais não é ‘privilégio’ das favelas dominadas pelo tráfico. Nas áreas controladas com mão de ferro pela milícia, o preconceito e a intolerância sexual também mostram a sua força. Em Nova Iguaçu, por exemplo, a caça aos gays, lésbicas e travestis pode chegar a extremos.
Morador da Vila de Cava, no subúrbio da cidade, o professor Carlos (nome fictício), 26 anos, foi vítima de vizinhos que incendiaram sua casa. Segundo ele, o atentado, no fim de 2007, foi motivado pela rejeição ao fato de ser gay.
“Estava dormindo e acordei com a casa em chamas. O fogo já estava por toda parte e, por sorte, consegui quebrar a janela do quarto, por onde saí. Na rua havia várias pessoas que, mesmo com meus pedidos de ajuda, permaneceram de braços cruzados. Alguns até dizendo que ‘veado’ tinha que morrer mesmo”, conta Carlos, que perdeu tudo no incêndio.
Próximo dali, em Mesquita, também na Baixada Fluminense, é igualmente comum encontrar vítimas da homofobia. Lésbica, a comerciante Jucyara Albuquerque, 44 anos, é mais uma que sofreu com o preconceito. Homossexual assumida desde os 16 anos, Jucyara afirma que tem um longo histórico de agressões.
“Já sofri muito por causa da minha orientação sexual. Certa vez cheguei a ser espancada por dois homens que me agrediram enquanto eu trabalhava. Eles simplesmente chegaram, começaram a me xingar porque souberam que eu era lésbica e partiram para cima de mim. Fiquei com o corpo todo machucado”, lembra ela.
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